quinta-feira, 30 de julho de 2009

Saiba,
que colecionei pedras, porque pensei num cristal vivo que delas poderia nascer com o tempo.
Não imaginei, que um vento forte viria e às atiraria, veemente, em meus olhos.
É uma pena simplismente não ter existido.

E continuar assim.

quarta-feira, 29 de julho de 2009

sobre (o) amor

É preciso silenciar a alma para escrever. Olhar nos olhos do pensamento materializado à frente. Sei que isso somente é possível porque fiz dele, a minha carne. Doei-me a uma visão, quis, por tudo, que se tornasse real, que lhe pudesse tocar e sentir.
A imobilidade me fez crer e ser. Crer no que desejei e ser o que pensei.
Tudo está tão quieto nesta noite, os cães dormem, pai mãe e irmãs vagando em sonhos e eu, veemente em pensar. Penso em você. O vejo em tempos vindouros, dividindo o silêncio de uma noite, a cumplicidade palpitante de uma cama, o preenchimento de um sorriso, a liberdade de uma gargalhada... comigo.
Você há em tudo o que existe e não há perspectiva fora da tua vigia: tudo lhe possui, se visto com meus olhos.
Já nos vi em tardes exaustar, envolvidas em beijos suados e clementes; já nos vi em meio a crianças, doces frutos da cerejeira que plantamos com sementes juradas em noites de amor eterno; lágrimas que escorreram e, você bebeu, quando beijou meu sorriso e assim o captou.
Acredito que amor seja mais um transbordamento, acima de qualquer outra coisa. Uma constância mútua. Não me refiro a doenças incuráveis, debilidade e sentimentos nefastos.
A cura para o amor é a troca dele. O doar, o prostrar-se, desde que a mão amada venha arrebatar a alma dilacerada pelo grito rogado e não percebido.
Sinto-me bem falando de amor contigo, mesmo que não saibas que estou a lhe escrever.
Não quero que penses mal. Não anseio prender-lhe ou sufocar nossa sementinha. Ela germinou e isso me basta para todos os dias dar-lhe água, poesias e preces. Compartilho com ela tua ausência. Talvez, se dela crescer uma árvore, que seja a maior e mais frondosa e que em seu tronco robusto, esteja grafado todo o amor permutado.
Não consigo dormir. Ando extasiada demais para concentrar-me em sono ou livro. Sinto-me largada ao horizonte interminável de um quarto sem sonhos. Sentei-me à cabeceira. Aproximei os joelhos do peito e ouvi a música. A música. Sempre dizendo que sou louca por chorar ou por te amar, chamando-lhe a mim desesperadamente. É uma dor boa se sentir, te faz arder.
Chamo a ti. Um pedido que insurge de meu cerne e busca diretamente o seu. Não quero despertar teus olhos sonolentos, nem espreguiçar tuas palavras... Apenas penetrar surdamente, no vão dos teus seios, ali, onde guardas o bem mais precioso e adormecer. Teu pensamento em mim, apesar de toda a sua vida e seu quotidiano. Um leve sorriso brotará em tua face, teu coração sorri! Aquece-me.
Visitar-te-ei em espírito para dormir com o teu sereno e único. Sentirás, quando eu adentrar teu quarto. Haverá uma presença pronunciada pelo calor febril que me perpetua até os germes. Somente isso e a canção. Sou louca por te amar e chamo-te na noite. Assim, aproximo-me. Assim me percebes. Teu corpo, agora, inerte e extático.
Já passou. Já passou, meu amor. O que é o corpo senão escravo de um mundo pequeno. O que é da imagem sem a visão. Um nada é sem o outro. Um submetido é, naturalmente, ao outro. Portanto, não me atenho a sentidos, não, quando não os posso conter em minhas circunstâncias. Em meus braços.
Sei que estás dormindo, dando a teu corpo o tempo para refazer-te – como queria ter na boca teu hálito matinal; como queria desbravar teus caminhos ferventes com minhas mãos; tua expressão cálida, mal iluminada pela lua. Tua cor castanho-clara, revivendo meu branco-amarelado – mas, regozijo-me em saber, também, que nos reconhecemos, no mundo. Recordei-te, talvez de outra vida ou eternidade - demos mais um laço.
Sorverei teu sono sublime e derramarei em teu corpo, o bálsamo e a devoção do meu ser pelo teu. O que meu ser é com o teu, quando abertos, quando perdidos, você dentro de mim e eu dentro de você. O transmutamento.

Silencio-me agora.

terça-feira, 28 de julho de 2009

o frio

A casa. O destino está grafado com tintas cor de tempo nas paredes que a tudo sabem, percebendo cheiro das lágrimas. Tanto sentiu, tanto escorreu a dor errante como a chuva batendo na pedra que, agora, precisa de uma nova mão de vida em sua pele crepitando em bolhas e reboque. Sãos os sinais da morte inerente a mim e à matéria, a sua gota borrando cada dia um pedaço do céu que anda indeciso, sem saber se deve ou não colorir e tornar meu pensamento visível. Meu pensamento é visível, mas não presente. Nada vejo além da lua. E peço à noite que não se demore enquanto madrugada, gerando o dia em seu ventre. Gosto ter nos braços o calor nu e pequenino da manhã recém-nascida. Entardece, não percebo; somente o sol baixo ao meu lado e o pensamento, o cigarro. Por mais que me costure e decalque o sem forma, não sinto seu calor a não ser pelo sol. Pelos cigarros. Suas cores estão vivas além daqui, ardendo onde meu desejo não tateia...

Numa das tardes de inverno, dessas que transcorrem das manhãs perdendo as cores, sentei-me defronte a um piano. Senti os pensamentos confusos, perfurando-me os poros obstruídos pelo pó que a inércia acumulou. Tal efusão remeteu-me uma valsa perolada daqueles dias em que o sol nasce e não há espaço no quarto para ele. Há uma presença ali que me coube no tenro diamante cinza da noite dormida em outro corpo e o sonho me buscou sereno, falando baixinho. Deu-me a mão, sentamo-nos nas colinas que cultivara em silêncio, nos observamos entre sopros e sorvedouros, entre cigarros e beijos. Guardo-o desde menina quando me via presa no espelho turvo do cotidiano; a cada dia mais como ele, quando cria que era mais como eu.

Abri os olhos. Havia não o amarelo claro, mas uma prata derramada em meu corpo. A cor e o ar frio que penetravam da janela era o sol ressentido, porque suas cores estavam do lado de fora da porta. A casa se deteve reluzente e satisfeita, sorrindo em resignação. A música perolada continuou a oscilar em nossa pele. Era uma valsa, talvez. Uma narrativa do pensamento que o desejo se empenhou e tornar real. Visível a corpo e olhos. Havia forma de alguma maneira, pois sentia suas cores, agora transpostas, vibrando sob minha pele. Abri os olhos. Era ele.