sexta-feira, 24 de junho de 2011

.O aborto

Os abortos escorrem no revés de suas mães; vítimas caladas e anêmicas no restolho de vida inexistente.

Ânsias infantis, depois ânsias jovens;

E em pouco tempo a senilidade. O brotinho avança pelo tempo e, logo, olha-se com assombro, por esperar e esperar sobre o cume de uma montanha de onde o caos foi gotejado sobre sua cabecinha lisa e a água negra escorria, banhando-lhe o corpo, o vão dos dedos, empoçando olhinhos, até que despertasse e de súbito disparou pelas pernas no sentido contrário, não haverá direção, não haverá meios de guiar-se, pois seguir adiante seria atirar-se no além finito, sabido do cerne estatelado e ressuscitado de dor e prosseguir.

Atirou-se, só que para trás, dando-se com o que antes havia propelido adiante ao interminável horizonte vertical; a gravidade não o perceberia inerte, em sua imensa atuação; são vidas por demais caídas entre a racionalidade e o bálsamo emocional. Permaneceu debatendo-se no meio fio da vida que avançava faminta e consumindo.

A grande boca aberta o retia na enormidade imperscrutável do limbo labial, colérico, pequenino.

Tateou o corpo e verificou os grandes testículos, o pênis, os pelos: o homem reconheceu-se a si como o pai tardio encontrando o filho – esperado, desconhecido – quem é este homem vertendo? - a criança para si, do homem velho.



E a pergunta lancinante trucidava-lhe a consciência volátil e ao percebe-lo, tentava apanhá-lo e apertá-lo contra o peito, acariciá-lo temdodo-o e mesmo que o amor lhe ferisse, eram seus pedaços ainda ali, a servi-lo e que talvez se os desse calor, aquilo tudo se tornasse uma vida mais inteira, agregando-o a si mesmo e à sua existência fracionária se moldasse com o breve escopo de ao menos manter-se inteiro; a forma ele jamais conhecera.



E um dia ele se esqueceu de que correra, correra muito e que não chegara além de onde esteve desde que culminou o pico da morte inaudível – na montanha – e tudo fora apenas o excremento da sua cabeça fraca, do amor pelo avesso, da inocência brutal e que logo após era conformada, flêurica, combatida com picos repletos da vagueza caracterizadora da inercia ludibriante, dos passos que a criança trocou fora do chão; amorfa.

Penny arcade

Penny arcade traz lembranças de lugar apinhado, da luz multicolorida e um claro feixe sobre nos, ensopados, adoçando nossas peles com o mel que o poro quente expele e o contentamento imantando a vacuidade que há entre nós e somente isto.

Batemos os sapatos, as memorias, as vontades, tudo ao lado de fora daquela sala; e o som traz o teu cotidiano metálico para aqui, o mais íntimo do que se é, único e inteiramente ali.



Nós.



Nada pode separar a identidade dos nossos corpos.

Dito, o amor

É triste sem você.
O conforto mora onde está teu pensamento, e
Ver-te é iluminar ainda mais a face clara que o
amor guarda e leva teu nome.
Cada silêncio longo talvez seja o bramir do
coração,
Que por vir morar em mim o teu,
Que por tornar-te a ti o meu,
São a mesma coisa;
O mesmo pulso, o mesmo gesto rítmico
de vida.
E divisando-te a pele ora rubra,
O vasto branco detentor do sagrado
sangue que lhe recobre as faces
Tornando-te, de repente, a paixão e a paz no meu
corpo;
O céuinferno sedante
Que se instala fora da tua presença
mediadora do haver.

E significamos a razão pura.

Pois que somos a composição,
Somos a permuta devota de um sentimento íntimo.
E as horas prosseguem vagas
Sob a tua vigília vastíssima
De olhos prolongados por sobre
as ondas de ausência que me causa.

Guarda o meu prosseguir,
Apascentando-me.